quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

A partida do filho amado

Foi exatamente no dia 10 de maio de 1973 que isto aconteceu. Em plena madrugada de inverno, às três horas da manhã, foi o momento mais triste de toda a minha vida até então, pois vi partir meu filho que, como bom brasileiro e cidadão honesto, seguia para juntar-se aos demais colegas para servir a Pátria, incorporando-se na Polícia do Exército em Brasília, capital de nosso querido Brasil. Os meus olhos se transformaram em nascentes que vertiam água e mesmo que eu fizesse o maior esforço para que isto não acontecesse, eu não podia impedir. Seguindo-o com meus olhos
tristes, até onde puder ver e por fim perdi-o de vista, desaparecendo na escuridão da madrugada. Fiquei vendo apenas uma silhueta quando passava sob os faróis da iluminação pública, até desaparecer na primeira esquina, e foi como se meus olhos tivessem apagado, ficando sua imagem viva no meu coração, que por sua vez também sentia a dor da despedida. Minha última esperança era que por ser filho único ficasse no excesso de contingente da última seleção, mas isto não aconteceu e partiu definitivamente. A espera das primeiras notícias foi um verdadeiro calvário. Enfim, a primeira missiva, as minhas mãos tremiam ao abri-la, e quando quis começar a ler não pude agüentar e chorei copiosamente, quando olhei para o meu marido que estava
ali ao meu lado pude ver que seus olhos também estavam rasos d'água, e observei que ele sentia tanto quanto eu a ausência do filho amado. Sete meses se passaram, e muitas outras cartas chegaram com fotos dele, e com estas eu me consolava, porque uma carta qualquer pessoa pode escrever, mas a foto era dele, trazendo a certeza que ele estava vivo e muito bem disposto. Muitas também foram as cartas que nós mandamos, e o tempo passou, o Natal estava próximo e quando menos esperávamos, veio a notícia que ele viria passar o Natal conosco. Fazia então sete meses que não o víamos pessoalmente, e ninguém a não ser o coração de uma mãe pode dizer quanta e quão grande foi a minha ou a nossa alegria quando este filho chegou. Sendo esta a segunda vez de espera, com a diferença de que na primeira vez não sabia se seria rapaz ou menina, e desta vez sabia que era um homem, sim, porque esta não era a
espera do nascimento e sim a volta de uma triste partida. Enfim, a chegada, a alegria, o abraço, a correria para cumprimentar o vovô, a vovó, os tios, mas é claro que antes disto tudo os cumprimentos foram para nós, os pais. O nosso filho continuava o mesmo, só mais magro, e isto me entristeceu muito, e até hoje não sei se foi a comida ruim ou a saudade que deixou nosso filho tão magro. Dias felizes transcorreram, passou o Natal e novamente o filho querido partia, para o final da etapa de sua vida militar. Com isto novas dores, novas tristezas e paixões, grande
saudade e novamente a espera à volta. Abril de 1974. Todo o sorriso, tudo o que ele falava, toda a gíria que ele usava, tudo, enfim, foi e é e sempre será lembrado com muito carinho, por uma mãe que sente um tédio profundo e a alma cheia de saudade
enquanto espera a volta do filho amado. Dia 27 de abril de 1974, quando eu menos esperava, vi um táxi parar na frente da minha casa, e para minha grande alegria vi meu filho desembarcar. Foi uma surpresa porque era esperado para maio, mas naquela hora a alegria e o contentamento fizeram-me esquecer o resto. Foi o fim de um ano
de angústia, tristeza e grande saudade, que aliás para mim um ano parecia um século, mas como se vê tudo tem um começo e um fim, e este foi o fim do Serviço Militar, para agora começar a vida civil nova de Loreno Luiz Zatelli Hagedorn. (27.4.1974)
O dia 10 de maio de 1973 foi o dia da partida do meu filho para Brasília, a fim de servir a Pátria. Por ser a vez primeira que ele se afastava da casa, para passar muito tempo fora, sem que pudesse vêlo, entrei em depressão, fiquei agressiva, muito nervosa, não podia comer. Então o meu marido mostrou que também podia ser bom e
paciente, fazia tudo para que eu me sentisse bem. Quando chegava uma carta do filho, eu a lia chorando e respondia chorando, mas superei também essa fase. O tempo passou e o meu filho, que estava servindo o Exército, voltou depois de um ano de sofrimento. Mas como ele já era um homem, queria ficar numa outra cidade, para estudar e trabalhar. Eu percebia que, aos poucos, o nosso filho estava se afastando dos pais e é claro que isto, menos dia mais dia, tinha que acontecer. Não podemos
exigir que fiquem sempre ao lado da gente, porque todos precisam do seu espaço.

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