quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Abro a porta

Abro a porta e deixo a noite entrar na esperança que traga de volta meu grande amor; e nada, a malvada vem só. Eu mais uma vez estou aqui, sem poder saciar a fome, tenho as mãos cheias de doces e suspiros, mas estou só. Olho, então, pela janela do meu
quarto e ninguém sequer acena para mim e continuo só. Volto até a sala e vejo seu retrato, viro-o na esperança de que atrás dele encontre o que procuro, mas em vão, pego um chocolate, abro-o ao meio, na intenção de reparti-lo com ele, meu grande amor, e mais uma vez não está comigo e eu estou só. Deito no sofá, levanto os olhos para o teto e o vejo frio com sua cor branca como a morte. Em cima da mesa, um vaso com flores e um cinzeiro, ao lado um armário e sobre ele a balança caseira, onde eu
costumava pesar os ingredientes para fazer seus doces preferidos, que hoje já não faço mais. A minha noite é de pesadelos, fecho as portas e as janelas para ficar sozinha com a noite, e chorar a ausência de meu grande amor. É madrugada, o sereno caindo soberbo sobre as plantas, anunciando um dia cheio de vida e de sol. Abro a porta e deixo os raios de sol penetraram em minha casa, e eu gritando: entrem, entrem! Venham comigo procurar o amor, mas nada encontramos. Então, vejo os pássaros voando e uma voz de consciência me diz: ame os pássaros, os animais, que eles lhe permitem que os ame sempre. Mesmo que os passarinhos façam seus ninhos e se casem podes continuar a amá-los sem perigo algum, e sem magoar ninguém. Os cães, os gatos podem se multiplicar, mas podes continuar a amá-los sem medo que alguém te proíba.
Agora sei que só podemos amar o que nos for permitido, e o que for proibido deixa que outros amarão. E assim abro a porta, deixo a luz do sol entrar, na certeza de
que não lesei ninguém.

(10.5.1975)

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