quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Paro agora

De andar, de sonhar, de viver, de querer, de deixar, de morrer, de amar, de buscar, de entregar, de pensar, de subir, de descer, portanto parei. Aqui, agora! Só não paro de escrever, e em cada letra vai um pedacinho de mim, a minha angústia, a minha dor, meu grande amor, meu sofrimento, minha alegria e o pensamento junto com meu cansaço. Eu lutei, sim, com toda a força do meu coração, com toda minha força física e mental, lutei sim e muito mesmo, tudo em vão, agora eu que tive uma força fora do comum, eu que sempre contei com um futuro mais tranqüilo, eu que nunca fiz o mal a quem quer que seja, nem a um animal sequer, segui transpondo todas as barreiras que se erguiam frente a mim. Hoje, agora pela primeira vez, me vejo diante de qualquer coisa intransponível; e eu, finalmente, fracassei. O que fiz de errado, meu Deus, para sofrer tanto? Não, vamos tirar Deus disto, porque ele é bom, ele é tudo e não está pedindo para me martirizar, sou eu que estou fazendo isto. Mas porque sofro, pois se eu errei, se pequei, só prejudiquei a mim mesma não magoando, e não estou culpando ninguém, então porque sofro tanto? Já não sou mais aquela mulher carinhosa, fugiu aquele ser humano e não existe mais aquela pessoa paciente e lutadora, aquele corpo incansável cansou, aquela vida alegre entristeceu, aquele rosto corado empalideceu, aquela flor viva murchou, eu já não existo mais. Mas o que serei agora, uma telha num telhado, uma pérola num colar, uma cerca cercando alguma casa, uma estrada em que todos pisam ou uma pedra que se joga onde se queira? Bem, mas estes são coisas, seres mortos, e eu estou viva, eu ouço, falo, vejo, sinto, tateio, mas não tenho fome e não entendo mais nada nem ninguém. Tudo tomou um rumo diferente do que eu imaginava, tudo se dificulta onde não há dificuldade, tudo se complica onde não há complicação, tudo se fecha sem haver portas nem janelas, todos choram sem derramar lágrimas, todos riem sem demonstrar alegria, tudo está fora do ritmo onde há um ritmo tão bom, enfim, não entendo mais nada e diante disto fracassei, esta é uma barreira intransponível, pode ser que melhore um dia, para que eu possa levantar, de novo erguer as mãos ao alto e pedir a Deus para me refazer.

(10.2.1975)

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